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14 dez, 2020

Você é telefone sem fio?

Se preferir, ouça o artigo.

Tenho certeza que você sabe como funciona a dinâmica do telefone sem fio, mas vamos lá refrescar a memória. Uma pessoa pensa em uma frase e é por ela que começa a brincadeira depois uma a uma vai passando aquela informação recebida à diante até chegarmos ao último participante que fala alto a frase que recebeu para confirmar se foi assim que ela foi dita inicialmente. Por via de regra quando criança as frases terminavam muito distantes da inicial, pois, bem provavelmente, algum engraçadinho no meio do caminho achava legal tumultuar a brincadeira e falar algo bobo. Escrevendo isso me veio à lembrança de que eu não gostava nada desta situação, eu ficava impressionada – de forma inocente mesmo -, como poderia ter mudado tanto a frase se éramos somente em torno de 7 a 10 pessoas? Sempre fui a favor da honestidade acredito que por isso ficava tão incomodada com a brincadeira. Se tal mudança de informação ocorria ali em um pequeno grupo o que podemos imaginar quando falamos de milhares ou milhões de pessoas envolvidas?


Gosto mais de escutar do que falar, das minhas memórias mais distantes já era assim, o fato de querer me manter fiel ao que escuto se mostra constantemente em meus dias mesmo que levando adiante informações que nada tenham a ver comigo. Já mencionei aqui que há alguns anos ainda via e seguia sites e perfis de pessoas famosas e fofocas, parece que ficar olhando a vida dos outros para não cuidar da minha aliviava um pouco a barra. Admito que dar um basta nisso, para mim, foi algo libertador, pode parecer bobagem para você, mas não saber o que está acontecendo na vida das pessoas é motivo de paz na minha. Não, eu não perdi o interesse nas pessoas, mas meu interesse digamos mudou, eu sigo ouvindo e prestando atenção, mas agora direcionado a quem vem falar comigo, quem me pede um conselho ou quer compartilhar algo pessoal. Não tendo mais necessidade de falar da vida de outras pessoas para ter algum assunto. Longe de mim, dizer que eu não comento nada que vi, que li, mas cada vez que vou por esse lado eu tento voltar quanto antes para o ambiente que tenho conhecimento ou que posso ter domínio a minha boca e pensamentos.


Por conta da ‘internet’ as informações rodam por aí em uma velocidade tão grande e de tão fácil acesso que acostumou a maioria das pessoas a serem preguiçosas de pensamento, muitas não se dão  nem ao trabalho de ir até às fontes, e muito menos atrás das seguras, entrando em modo ativo de repetição sem nem averiguar se aquilo que estão passando adiante é real ou não e acrescentando detalhes através da sua forma de ver o mundo. É o telefone sem fio com nova roupagem, é o falar por falar, é o dizer algo para não ficar quieto e não julgarem que você não tem opinião. Porém, se você abrir a boca e falar algo que ouviu de passagem, ou comentário de um terceiro, e não tem a menor certeza sobre o que está dizendo é mais válido do que afirmar que não tem uma opinião sobre isso? Isso já não é mais a brincadeira que jogávamos, hoje um comentário feito mesmo que sem nem maldade da sua parte, mas sem qualquer certeza alguma do que está sendo dito é necessidade de falar por falar. Assim como você falou de um, aquele um, fala de outro, e outro do um em um círculo infinito de repetições sem nem nenhum conhecimento muitas vezes.


Se for possível para você quebre esse telefone sem fio, fale sobre coisas que você tenha conhecimento e não suposições, sem levar adiante assuntos bobos e sobre os outros só para ter sobre o que conversar. A pessoa quando fala algo a você diz aquilo carregado de sua opinião, mostrando muitas vezes a forma como ela lida com as situações, com o diferente, com as dificuldades, com as comparações. Seja filtro, use filtro, aquela informação que chega até você não é a única versão e muito menos sem a certeza de que é a verdadeira. Respire fundo, não se deixe levar pela emoção que as pessoas colocam no seu discurso. Escute atentamente, mas sempre de forma passiva sem tomar aquilo como a única verdade existente. A necessidade que temos como seres humanos de falar é enorme, e natural, pois é um dos meios de nos comunicarmos, mas se for para gerar caos, tumulto, desrespeitar os outros do que adianta esse poder? Falar sobre outras pessoas, mesmo querendo ajudar e sem ter sido solicitado, não nos coloca em um nível altruísta muito pelo contrário nos deixa estacionados até que consigamos entender que este tipo de brincadeira, real, não tem a menor graça. Lhe pergunto, honestamente, você é um telefone sem fio?